Reforma tributária. Injustificável omissão do governo federal

Quebrar para consertar ao longo de 50 anos não é solução!

Por incrível que pareça há duas propostas de reforma tributária radical tramitando paralelamente no Congresso Nacional: A PEC nº 110/19 no Senado Federal e a PEC nº 45/19 na Câmara dos Deputados. As duas propostas tratam mais ou menos do mesmo assunto com algumas particularidades distintas.

Ambas as PECs esbarram na cláusula pétrea que proíbe a deliberação pelo Congresso Nacional de emendas tendentes à abolição da forma federativa do Estado. No entender do STF qualquer matéria que venha enfraquecer a Federação é atentatória à cláusula pétrea. Basta simples leitura das propostas em discussão para saber que retirar o ICMS e o ISS dos Estados e Municípios, respectivamente, inviabiliza as suas  finanças públicas.

Exatamente no momento atual em que sete Estados estão financeiramente quebrados – o do  Rio sequer vem cumprindo o RRF acordado com a União –, as duas propostas em discussão no Parlamento Nacional, em nome da simplicidade,  funde os tributos sobre o consumo abrangendo não só os tributos federais, como também, o  ICMS e o ISS formando o IBS [1].

Pouco importa o desastre que isso vai representar para a nação, porque o protagonismo pela reforma não permite que os Senhores Deputados e Senadores enxerguem o óbvio que até leigos percebem. Como é possível votar a toque de caixa uma proposta que retira quase 90% da receita dos Estados e mais de 60% da receita dos Municípios? [2]

A PEC nº 45/19 recebeu uma emenda substitutiva para piorar o que já estava muito ruim. O substitutivo funde todos os tributos federais deixando apenas o imposto de renda e os dois impostos regulatórios do comércio exterior (II e IE), substituindo-os por um imposto único sobre movimentação financeira –IUF – que viola ostensivamente o princípio da capacidade contributiva e o princípio que veda o efeito confiscatório do tributo. O imposto, como espécie tributária destinada à retirada parcial da riqueza produzida pelo particular, por óbvio, somente pode incidir sobre operações, fatos ou serviços que revelem signos presuntivos de riqueza. Onde esse signo na hipótese de mera transferência de dinheiro de uma conta para outra do mesmo titular? Onde o signo presuntivo de riqueza quando um advogado recebe em sua conta o valor do depósito judicial feito a favor de seu cliente que é o legítimo titular desse dinheiro? Por que, então, deverá haver dupla incidência do IUF? Quando o advogado recebe os depósitos em sua conta, e quando ele repassa ao cliente o dinheiro que lhe pertence.  O que é pior, quem recebe, também paga o IUF. Dessa dessa lógica inventada por mágicos da reforma tributária, o banco depositário que recebe o depósito judicial deveria igualmente pagar o IUF! Por que não? Por que os banqueiros não gostam de pagar tributos e muito menos o  IUF?

A maior culpada por essa balbúrdia na área da reforma tributária é a falta de definição do governo federal que ameaça apresentar a sua proposta, mas não o faz. É vacilante, é reticente e a  cada dia que passa há uma mudança de discursos. Ora diz que irá apresentar a sua proposta, ora diz que deixará tudo por conta do Congresso Nacional se as discussões das PECs estiverem avançadas. E mais, antes era radicalmente contra o imposto do cheque; depois passou a aceitá-lo como substitutivo parcial da contribuição previdenciária patronal. Voltou a condenar o IUF depois que foi apresentado um substitutivo à PEC nº 45/19[3].

Por fim, para gerar mais insegurança e mais demora, o governo resolveu exonerar o Secretário da Receita Federal que já havia praticamente delineado a proposta de reforma tributária remexendo apenas com os tributos federais — o IPI e o PIS-COFINS e parte o IOF, deixando em paz o pacto federativo. Por esse projeto de Proposta de Emenda a fusão do ICMS e do ISS ficaria para o futuro, quando fosse feito um novo pacto federativo, o que na conjuntura  atual não seria possível. Primeiro há que sanear as finanças dos Estados e Municípios. A PEC nº 45/19 em discussão, ao invés de contribuir para sanear as finanças estaduais e municipais, agrava ainda mais essas finanças. Além disso concede à  União o prazo de 50 anos para repor as perdas arrecadatórias dos Estados. Não é razoável, nem racional quebrar os Estados para, ao depois, recuperá-los gradualmente ao longo do meio século! Quanto aos Municípios, nem previsão de ressarcimento das perdas arrecadatórias a PEC nº 45/19 traz,porque na visão dos que elaboraram a proposta os Municípios são meras circunscrições administrativas dos Estados como nos Países da Europa, de onde surgiu essa proposta de IVA com nome de IBS.